A história dos videogames no Brasil é cheia de curiosidades, reviravoltas e momentos marcantes. Para quem viveu as décadas de 80 e 90, é impossível não lembrar do impacto que esses consoles tiveram na vida da molecada e como a indústria cresceu, mesmo enfrentando várias barreiras, como os altos impostos e a ausência de grandes fabricantes. O videogame foi se tornando uma parte fundamental da cultura pop, e a maneira como ele chegou ao Brasil é um reflexo das gambiarras e adaptações que fazem parte do nosso jeitinho.
Tudo começou ali nos anos 70, quando os primeiros consoles chegaram timidamente ao país. Um dos pioneiros foi o Telejogo, lançado pela Philco em 1977. Ele era bem simples, com gráficos extremamente básicos, e oferecia jogos como futebol, tênis e paredão, todos variando a mesma mecânica de mover uma barrinha para rebater a bola na tela. Mas a verdade é que a galera mal conhecia o conceito de videogame naquela época, então, qualquer coisa que fosse interativa na TV já era uma novidade de cair o queixo. O Telejogo é considerado o primeiro videogame fabricado no Brasil, e logo depois veio o Telejogo II, com alguns jogos a mais e gráficos um pouco melhores.
Mas foi nos anos 80 que a coisa realmente começou a pegar fogo com a chegada do Atari 2600. Esse console, lançado nos Estados Unidos em 1977, desembarcou por aqui alguns anos depois, mas de um jeito meio diferente: a maioria dos Ataris vendidos no Brasil eram produzidos por empresas como Polyvox e CCE, que fabricavam o console de forma autorizada ou até em versões “genéricas”. Isso aconteceu por conta da política de reserva de mercado, que impedia a entrada de tecnologia estrangeira no país, obrigando as empresas brasileiras a criarem suas próprias versões de produtos. Foi uma época em que era comum encontrar consoles com nomes diferentes, mas com os mesmos jogos do Atari original.
E por falar em jogos, quem não lembra de clássicos como River Raid, Enduro, Pitfall e Pac-Man? Esses títulos marcaram uma geração e fizeram do Atari o console mais popular no Brasil durante os anos 80. O legal é que esses jogos eram bem simples, mas tinham uma jogabilidade viciante, o que fazia a galera passar horas e horas tentando bater os recordes. A febre do Atari foi tão grande que ele se tornou sinônimo de videogame na época, assim como a palavra “PlayStation” virou sinônimo de console de videogame muitos anos depois.
No final dos anos 80, a coisa começou a esquentar ainda mais com a chegada dos consoles de 8 bits, principalmente o Nintendo Entertainment System (NES) e o Master System, da Sega. Mas, novamente, o Brasil tinha suas peculiaridades. O NES, por exemplo, nunca foi oficialmente lançado aqui na época. O que a gente teve foi uma enxurrada de clones, como o Phantom System, da Gradiente, que era 100% compatível com os cartuchos do NES. Já o Master System teve uma história diferente. A Tectoy, empresa brasileira, conseguiu os direitos de distribuir e fabricar o console oficialmente no Brasil. E isso fez toda a diferença.
A parceria entre Sega e Tectoy foi uma jogada de mestre, que ajudou a consolidar a marca no país. O Master System foi um sucesso de vendas e trouxe jogos memoráveis, como Alex Kidd in Miracle World, Shinobi e Sonic the Hedgehog. E não só isso: a Tectoy lançou versões localizadas de jogos, como o Chapolim vs. Drácula e Mônica no Castelo do Dragão, que usavam os gráficos de jogos da Sega, mas adaptavam os personagens para algo mais familiar ao público brasileiro. Isso criou um forte laço entre a marca e os jogadores.
Nos anos 90, veio a geração dos 16 bits, e a batalha entre Sega e Nintendo esquentou ainda mais. De um lado, tínhamos o Mega Drive (ou Genesis, como era chamado fora do Brasil), também lançado pela Tectoy, que continuou a aliança com a Sega. O Mega Drive trouxe jogos que ficaram gravados na memória dos jogadores, como Sonic, Street Fighter II, Mortal Kombat (com sangue, o que fez a alegria da molecada) e Altered Beast. Do outro lado, estava o Super Nintendo, que finalmente chegou ao Brasil de forma oficial, distribuído pela Playtronic, uma parceria entre Gradiente e Estrela. Essa foi a época de ouro dos videogames no Brasil, e era comum ver as lojas cheias de cartuchos, acessórios e até campeonatos de jogos.
Os anos 90 também foram marcados pela chegada dos fliperamas, ou arcades, que viraram febre nas grandes cidades. Jogos como Street Fighter II, The King of Fighters e Mortal Kombat dominavam as casas de fliperama, onde a galera se reunia para desafiar os amigos e ver quem era o melhor. O ambiente era quase uma arena de batalhas, com as fichas de metal passando de mão em mão e os gritos de vitória ecoando no ar.
Já no final dos anos 90 e início dos 2000, veio a transição para os consoles de 32 bits, como o PlayStation da Sony. Esse console foi um divisor de águas, tanto no Brasil quanto no mundo. Mesmo sem uma distribuição oficial no começo, o PlayStation dominou o mercado brasileiro por meio das famosas cópias “alternativas”, já que a pirataria de CDs facilitava o acesso aos jogos, que muitas vezes eram muito caros. Jogos como Resident Evil, Final Fantasy VII, Gran Turismo e Metal Gear Solid conquistaram os corações dos gamers, e o PlayStation se tornou o console mais popular da época.
Em paralelo, tivemos o Sega Saturn, que não teve tanto sucesso quanto o PlayStation, mas ainda assim trouxe bons jogos, como Virtua Fighter, Panzer Dragoon e Sega Rally Championship. A Tectoy continuava trazendo os consoles da Sega para o Brasil, mas a empresa começou a perder força com o tempo, especialmente com o fracasso do Dreamcast, que foi o último console da Sega.
Nos anos 2000, a cena dos videogames no Brasil começou a mudar com a entrada oficial de empresas como Sony e Microsoft, que passaram a distribuir diretamente seus consoles aqui. O PlayStation 2, lançado em 2000, se tornou um verdadeiro fenômeno, com uma biblioteca gigantesca de jogos e uma popularidade que durou por anos. Mesmo com a chegada do Xbox e de outros consoles, o PS2 dominou o mercado brasileiro por muito tempo. Jogos como GTA: San Andreas, God of War, Pro Evolution Soccer e Shadow of the Colossus eram obrigatórios em qualquer coleção.
A Microsoft, por sua vez, fez uma grande aposta no mercado brasileiro com o Xbox 360. A empresa investiu em trazer o console oficialmente para o país, e com isso, conquistou uma base sólida de jogadores. Jogos como Halo, Gears of War e Forza ajudaram a criar uma comunidade forte de fãs do Xbox por aqui. Enquanto isso, a Sony também trouxe o PlayStation 3, com jogos que marcaram a geração, como The Last of Us, Uncharted e Gran Turismo 5.
Hoje, com a chegada dos consoles da nova geração, como o PlayStation 5 e o Xbox Series X|S, o Brasil continua sendo um mercado importante. As empresas têm investido cada vez mais na região, com lançamentos simultâneos e suporte em português para os jogos, algo impensável nas primeiras gerações. Além disso, o mercado de PCs e jogos online cresceu exponencialmente, com títulos como League of Legends, Counter-Strike e Fortnite dominando as lan houses e agora, o cenário competitivo de eSports.
A história dos videogames no Brasil é um reflexo da perseverança dos gamers brasileiros, que enfrentaram dificuldades como altos preços, falta de distribuição oficial e até pirataria para continuar jogando e explorando novos mundos virtuais. De consoles genéricos e clones até os lançamentos de última geração, os videogames sempre encontraram um lugar especial na cultura do país, e o futuro promete trazer ainda mais inovações e memórias para as próximas gerações de jogadores.